Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 14 e Final

A Vigilia em permanência

Minha vida é a morte, mas a morte fisica parece mesmo pior por causa do meu medo de punição.

O que devo escolher?

Em minha ignorância todas as coisas parecem contraditórias e não posso conciliá-las.
Eu não consigo encontrar a virtude e sabedoria ocultas nos meus testes diários , já que eu não consigo suportar essas provações com paciência.
Eu fujo da quietude por causa do meus maus pensamentos, e assim me encontro cercado pelas paixões que me tentam através dos sentidos.
Eu quero jejuar e manter a vigília, mas estou impedido pela presunção e preguiça.
Eu retiro-me de tudo e fujo por medo de pecar, mas a indiferença é novamente a minha perdição.

Muitos, porque tinham uma fé firme, receberam coroas de vitória depois de passar através de batalhas e testes como esses.

Foi por causa de sua fé que lhes foi concedido temer a Deus, e através deste medo foram habilitados para a prática de outras virtudes.
Se eu tivesse fé, teria encontrado o medo através do qual, teria recebido verdadeira devoção e conhecimento espiritual, e a partir deste conhecimento teria chegado força, conselhos, compreensão e a sabedoria do Espírito Santo e a paciência que torna possível ver todas as coisas, de cima ou de baixo, com uma mesma atitude mental.

Se acreditamos que alguém invisível está guiando a nossa vida, como podemos obedecer a nossos próprios pensamentos, quando dizem "eu quero isto” ou 'eu não quero isto”, “Isto é bom" ou "Isto é mau” ?

Se tivéssemos algum guia visível, podiamos sempre perguntar a ele sobre tudo, ouviamos a resposta e executávamos o que foi dito.

Quando não temos um guia visível, temos Cristo e devemos fazer perguntas a Ele através da oração do coração, com fé esperando sua resposta sem ansiedade e com paciente persistência que se irá manifestar em nossos pensamentos e ações.

Sem essa paciência, Satanás, não sendo capaz de afectar-nos em nossa ações, pode responder-nos em nossos pensamentos, fingindo que ele é o guia e, desta forma nos arrastando para a perdição, porque nos falta paciência.

São aqueles que não têm essa persistência , que em sua ignorância impetuosamente têm pressa em agarrar o que ainda não foi dado .

Mas aquele que, com paciente persistência ganhou experiência com as manobras do diabo vai lutar e se esforçar com a mesma paciência, a fim de atingir o objetivo , pois sabe que "o próprio Satanás se transforma em anjo de luz" e não há nada de surpreendente nisso, pois os pensamentos que ele faz para aparecer no nosso coração parecem ser pensamentos justos para aqueles que não têm experiência.

Por este motivo, é bom ser humilde e dizer 'eu não sei ".

Podemos esperar por muitos anos até que a resposta nos seja dada, sem ser esperada ou percebida, na forma de ‘sugestões’ ou ‘toques sugestivos ‘ para acçoes concretas e desta forma, alcançarmos o conhecimento espiritual ativo.

Mas só quando vemos esse conhecimento persistir em nós durante muitos anos, é que nós vamos entender que realmente fomos ouvidos e que recebemos a resposta de forma subtil e invisível.

"Aquele que perseverar até o fim será salvo", para que não exista excesso de confiança ou descuido, mas se continue na luta por medo pois mesmo uma pessoa que tenha outras virtudes, apesar de poder já habitar no céu, se ela tem um pouco que seja de presunção e soberba, isso pode fazê-lo cair como o que levou à queda do diabo, Adão e muitos outros.

Por isso não devemos nunca abandonar o medo, até que cheguemos ao paraíso do amor perfeito e não estejamos mais no mundo e no corpo.

Mesmo a pessoa que alcançou tal paraíso não vai abandonar o medo de sua própria vontade.

Pelo contrário, em virtude de sua grande fé o seu intelecto está liberto de toda a ansiedade sobre a vida e a morte do corpo, ele alcança o medo puro que é inspirado pelo Amor, ele tem medo porque é Amado sem ele próprio mostrar amor ,recebendo a benção do Amor sem o merecer e assim a alma atinge a humildade que transcende a natureza.

Pela humildade perfeita recebeu a discriminação por meio da qual percebe que é uma criatura de Deus, e que por si mesmo não pode fazer nada de bom nem sequer pode preservar o que lhe foi dado por graça, e que ele sózinho não pode nem remover a tentação, nem suportá-la através de sua própria coragem e julgamento.

Por meio de discriminação, ele atinge um certo grau de conhecimento espiritual e começa a ver todas as coisas com o olho do intelecto.



Mas, ignorante dos princípios interiores dessas coisas, ele anseia pelo Professor, ainda que não o consiga encontrar, porque Ele é invisível.

Ao mesmo tempo, ele não está disposto a aceitar qualquer outra pessoa porque sua discriminação lhe diz que esse alguém pode ser um impostor, então ele está como que perdido no oecano e como resultado encara tudo o que fez e tudo o que lhe tem sido ensinado como sem valor .

Ele adquire o conhecimento que de fato ele nada sabe, na verdade, um homem acha que sabe, mas ele não sabe nada ainda e que o que ele pensa que tem lhe será tirado, isto é, será tirado porque ele acha que tem ,mas na verdade não tem.

Assim, o homem que reconhece que é estúpido, ignorante e fraco, chora e lamenta-se, porque pensou que tinha recebido o que ele agora percebe que não tem.
Uma pessoa humilde tem consciencia de ser eterna pecadora e pratica o autocontrole e paciência em face de aflições, pela fé ganha vitória sobre seus inimigos, e quando conseguiu isso, então, pelo poder de Deus e através da sabedoria concedida é que se torna consciente de sua própria fraqueza e ignorância e treme de medo de recair por desobediência.

Por causa desse medo puro - medo que não é devido ao fato de que pecou - e por causa da gratidão, paciência e humildade, que lhe foram concediadas como resultado de seu conhecimento, ele começa a ter esperança que pela graça de Deus ele obterá misericórdia.

À luz de sua experiência das bênçãos que recebeu, ele teme não ser considerado merecedor de tais dons por parte de Deus.

Daí ele recebe maior humildade e mais intensa oração do coração e quanto mais estes aumentam, junto com a sua gratidão, tanto maior o conhecimento que ele recebe.
Assim, ele avança do conhecimento ao medo e do medo para a gratidão, e assim ele alcança o conhecimento que transcende tudo isso.

Não sendo capaz de dar graças adequadas para todas estas benções recebidas , ele se entristece, e então, mais uma vez maravilhado com a graça de Deus, ele é consolado.

Ele anseia que a vontade de Deus seja feita em tudo e abomina todas as honras e conforto, considera-se inferior a todos os outros homens e nem sequer pensa que é alguém .
Ele anseia pelas provações e testes á sua alma como bençãos e considera prazer e conforto como extremamente prejudiciais , mesmo embora possam ter sido enviados por Deus para o testar .

Durante este periodo de calcinamento interior ,o seu intelecto começa a atingir a pureza e retornar ao seu estado primitivo, isto é, para o estado do conhecimento espiritual natural que perdeu através de sua amizade com as paixões ou seja agora o intelecto vê as coisas como elas são, por natureza .

Tal conhecimento natural brota de discriminação, e nos permite perceber os princípios interiores das coisas sensíveis e inteligíveis.
Por conta disso, é conhecido como a contemplação dos seres criados, isto é, da criação de Deus.
É natural uma vez que pré-existe na natureza e vem da pureza do intelecto.
No entanto, mesmo o conhecimento espiritual natural não pode ser alcançado sem Deus, embora seja natural.

Mas quando as paixões obscurecem o intelecto, ele perde essa visão ‘natural’ , e se Deus não remove as paixões através da nossa prática das virtudes, o intelecto permanece cego.

O dom de profecia, porém, é de outra ordem, pois transcende a natureza e é concedido apenas pela graça.

Da fé nasce o medo e do medo vem tristeza interior.
Esta, por sua vez, produz a humildade, que dá origem à discriminação.
Discriminação, por último, dá à luz a visão espiritual e, por «graça de Deus«, o dom da profecia.

Para quem não tem conhecimento, Deus envia provações e tentações para que se abstenham de pecado, ao mesmo tempo incentiva-os, conferindo-lhes as bênçãos do corpo, de modo a não os desesperar.

Como seres inteligentes devemos prestar culto com a nossa inteligência inteligível à Inteligência divina.
Então, seremos dignos de receber dEle a expressão divina do Espírito Santo.

Pois Deus dá a oração a quem que reza e a quem na verdade reza a oração do corpo, Deus dá a oração do intelecto, e aquele que diligentemente cultiva a oração do intelecto, Deus dá a oração sem forma que vem do puro medo dEle.

Novamente, para quem pratica esta oração sem forma mas eficaz Deus concede a contemplação dos seres criados.

Assim que isso é alcançado e uma vez que o intelecto está libertado de todas as coisas , ele dedica-se a Ele em ação e pensamento e Deus permite que ele seja apreendido em êxtase, atribuindo-lhe o dom da verdade eterna e as bênçãos da idade a vir .

Assim, o conhecimento espiritual é bom se enche de vergonha o seu possuidor e se por isso o leva involuntariamente para a humildade, fazendo-o pensar que ele possui tal conhecimento indignamente .

No oposto o orgulho e a soberba só o cegam e fazem cair sem remédio pois essa paixão é capaz de tomar o lugar dos outros vícios todos .

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 13

Alegria e Julgamento

"Alegrai-vos no Senhor", disse São Paulo (Fp 3:1).

São Gregório de Nissa, disse que os pássaros e outros animais se alegram por causa de sua falta de consciência, enquanto o homem, ser dotado de inteligência, nunca é feliz por causa de sua tristeza, de não sermos dignos até mesmo de ter conhecimento das bênçãos que perdemos nesta vida de exílio dominada pelo pecado.

Mas se uma pessoa está constantemente consciente de Deus, ela vai se alegrar: "Lembrei-me de Deus, e me alegrei" .
Quando o intelecto se lembra de Deus, então ele esquece as aflições deste mundo, coloca a sua esperança Nele, e não fica mais perturbado ou ansioso, nada em toda a criação o pode prejudicar, alegra-se no Senhor, por causa de todas as coisas que Ele criou, maravilhado com o cuidado que ele demonstra para com suas criaturas.
A pessoa que atingiu conhecimento espiritual, não só se maravilha com as coisas visíveis, mas também é surpreendido pela sua percepção de muitas coisas essenciais invisíveis para aqueles que têm pouca experiência deste conhecimento.

Assim, ele olha com admiração não só a luz do dia, mas também a noite.
A noite é uma bênção para todos: para aqueles que praticam as virtudes que pertencem ao corpo,oferece tranqüilidade e lazer, estimula a lembrança da morte e do inferno para aqueles que se lamentam .
"Quando você se deita na cama, arrependa-se do que disse em seu coração" ou seja,arrependa-se no silêncio da noite, lembrando os erros ocorridos na confusão do dia e disciplinando-se a persistir na oração e na meditação atenta sobre o que você lê.
A prática das virtudes morais é efetuada meditando sobre o que aconteceu durante o dia, de modo que, durante o silêncio da noite, podemos nos tornar conscientes dos pecados que cometemos e podemos reflectir neles.

Quem obtem nesta pratica , por graça de Deus, algum progresso e descobre que, na verdade e não apenas em fantasia,realizámos alguma acção ou pensamento de acordo as virtudes morais e os mandamentos de Cristo, então tem de dar graças a Deus com temor e humildade e lutar para preservar essa virtude moral, disciplinando-nos a lembrá-la e não perdê-la novamente por causa do esquecimento ,pois demora muito tempo para fazer uma virtude moral em nós mesmos, enquanto que o que foi conseguido com tanto tempo e esforço pode ser perdido num único instante.

Primeiro de tudo, a noite nos lembra diariamente a criação do mundo, uma vez que toda a criação se torna invisível por causa da trevas, como era antes de vir à existência.

Isto, por sua vez nos leva a refletir como o céu estava vazio e sem estrelas, como acontece agora quando elas se tornam invisíveis por causa da nuvens.

Sentimo-nos sozinhos no mundo como Adão e no conhecimento da queda, louvamos o Criador do universo.

No meio de trovões e relâmpagos, vemos o dia do juízo, no despertar matinal do galo ouvimos a trombeta que tocará no mesmo dia, na primeira luz do amanhecer percebemos o surgimento da Esperança vivificante de Cristo , no homem acordando do sono vemos um sinal de ressurreição dos mortos e no nascer do sol um símbolo da segundo advento de Cristo.

Alguns, como os santos são arrebatados em nuvens no último dia , enquanto outros, como aqueles que irão ser julgados, estão indiferentes e continuam dormindo.
Alguns vemos se alegrar durante todo o dia em louvores, na contemplação e na oração e noutras virtudes, pois vivem à luz do conhecimento espiritual, como os justos , enquanto outros, vemos que persistem nas paixões e nas trevas da ignorância, como os pecadores .

Em suma, o homem de conhecimento espiritual acha que tudo contribui para a salvação de sua alma e para a glória de Deus: na verdade, foi por causa desta glória que todas as coisas foram trazidos à existência pelo Senhor e Deus do conhecimento e aspira, também sofrer com o Senhor através da aquisição das virtudes e ser glorificado com Ele através do desapego e conhecimento espiritual, e se alegrar pois,por indigno que seja , foi habilitado por graça a ser um servo do Mestre e um imitador da sua humildade.
Em seguida, 'elogios virão Dele ‘.

Mas quando isso vai acontecer?
Quando Ele diz aos que estiverem à sua direita,"Vinde, benditos, para herdar o reino" .

Que todos nós possamos ser considerados dignos de herdar o reino através da Sua graça e amor.

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 12

Juizo Moral

Pelo juizo moral o homem nem arrogantemente sobe às alturas para prejudicar os outros, nem desce inconsciente para ser prejudicado por alguém.
Escolhe o caminho do meio e mantém-o com a ajuda de Cristo.

Auto-Dominio

Auto-domínio é um sentido de discrição.

Como um bom pastor reune as ovelhas (os pensamentos divinos), afasta e mata os que lhe são nocivos como um cão raivoso, repele a insensatez e estupidez como se repelem os lobos esfaimados que pretendiam devorar as ovelhas uma a uma, mas mantém constantemente o olho na tal estupidez e coloca-a à vista da inteligência, para que essa estupidez não possa estar oculta no escuro e se infiltrar entre os nossos pensamentos.

O auto-dominio nasce do desejo de poder da alma para preservar as coisas boas e eliminar as más , sem ele haveria subidas desvairadas ou descidas degradantes ,disciplina todas as coisas e freia os impulsos irracionais da alma e do corpo, direcionando-os para Deus.

Coragem

A coragem não consiste em derrotar e oprimir o vizinho.

A coragem consiste em persistir em toda boa obra e na superação das paixões da alma e do corpo.
Porque a nossa luta não é contra os homens, é contra os demônios invisíveis, é uma guerra espiritual .

Ninguém que sofre de falta de coragem põe sua confiança no Senhor e, portanto, não pode subsistir firme na batalha, sendo arrogante ou cobarde.

Mas o homem justo é intrépido como o leão.

Justiça

Justiça é chamada por vezes de discriminação: estabelece o sentido justo em tudo.

A pessoa capaz de ser justa não é arrastada para baixo por descuido, covardia ou ganância, um escravo das paixões sem vergonha, nem é vítima de astúcia e impertinência, estupidez ou esperteza excessiva.

Em vez disso, ele julga com auto-contenção e suporta com humildade paciente, reconhecendo plenamente que o que quer que possui, ele recebeu pela graça .

É injusto para si mesmo e seu vizinho - ou melhor, a Deus - quando atribui suas próprias realizações para si mesmo.
Se ele acha que alguma coisa boa que ele possui é devida a ele, então o que ele pensa que ele tem lhe será tirado .

Paz

Quem está em paz com Deus e com seu vizinho, supera todas as paixões que são o "mundo" que devemos odiar, não as criaturas de Deus , mas os desejos mundanos.

A alma está em paz com Deus quando está em paz consigo mesmo e se tornou inteiramente deiforme.

Também está em paz com Deus quando está em paz com todos os homens, mesmo que sofra coisas terríveis em suas mãos.

Por causa de sua paciência não é perturbada, mas tudo suporta , tem bons desejos para tudo e ama a todos, por amor de Deus e á sua própria natureza.

Lamenta-se pelos incrédulos, pois eles estão se destruindo a si mesmos, reza pelos fiéis e trabalha em seu nome, e deste modo os seus próprios pensamentos estão cheios de paz e vive num estado de contemplação noético e pura oração a Deus.

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 11

Desapego

Quem consolidou a vitória sobre as paixões e atingiu o desapego continua a sofrer ataques dos demônios e os homens viciosos, mas experimenta isso como se estivesse acontecendo a outra pessoa, quando é elogiado, não é preenchido com auto-exaltação, nem quando ele é insultado, fica aflito.

O que recebe de agradável vem de Deus por graça para encorajar ,o que lhe chega de mal é um teste à nossa humildade e na nossa esperança no mundo para vir.

Tal pessoa é impassível, e ainda por causa de seu poder de discriminação está plenamente consciente do que produz dor.

Desapego não é uma virtude única, mas um nome e uma atitude para um conjunto delas , uma união de muitas virtudes e onde o Espirito Santo toma o lugar da alma humilde e desprendida de paixões, só em virtude da presença do Espírito Santo é que podemos dizer que estamos em desapego .

Quem disser que está desapegado sem o Espirto Santo estará apenas ‘insensibilizado’ e não realmente desapegado.

O homem que atingiu o desapego torna-se impassível do seu amor perfeito de Deus.
Às vezes ele medita sobre Deus, às vezes com o espetáculo de algumas das obras maravilhosas de Deus ou de uma passagem do divinas Escrituras .
Mesmo se ele está no mercado entre as multidões das pessoas, seu intelecto, age como se fosse o único.

Amor

Falar de amor é ousar falar de Deus .

Assim, o intelecto deve pensar sempre sobre assuntos divinos, enquanto que o desejo deve apenas constantemente aspirar a Deus e nada mais.

Ao ser amado, Deus vai morar e mover-se dentro dele e o corpo, embora relutante e sem vontade - por falta de inteligência - vai acabar por submeter-se à inteligência, enquanto a carne deixará de protestar contra o Espírito, e a mando da alma, irá executar obras de luz.

Assim como a lua cresce e mingua a cada mês, assim cada virtude particular de um homem cresce e diminui diariamente, até que esta virtude se torna firme e estabelecida nele.

Às vezes, de acordo com a vontade de Deus, ele está aflito, às vezes ele se alegra e dá graças a Deus, indigno como ele é para adquirir as virtudes, às vezes ele é iluminado, às vezes está na plena escuridão, até que seu percurso se conclui.

Há coisas que são enviadas para impedi-lo de se auto-exaltar, outras para mantê-lo fora do desespero.

A alma no mundo atual tem seus solstícios, e o intelecto experimenta escuridão, assim como virtudes e conhecimento espiritual, e isso continua até que, através da aquisição do Amor perfeito para onde todo o nosso esforço é direcionado, sejamos considerados dignos de exercer as obras que pertencem ao mundo para ser.

O conhecimento de Deus

Todas as coisas que Deus criou têm uma origem e, se Ele desejar, um fim, uma vez que eles foram trazidos para a existência a partir da não-existência.

Deus, porém não tem nem origem nem fim.

Porque somos criaturas, temos necessidade da ajuda de Deus e de inspiração, pois sem isso, não temos nem força, nem sabedoria.

Todas as criaturas são suscetíveis a mudanças porque são compostas de vários elementos que são chamados de compostos.

Mas Deus é incorpóreo, simples .
Quem se torna semelhante a Deus, só tem uma vontade e não muitas vontades compostas.

Seu intelecto é simples e está sempre concentrado no que é sem forma, mas pela providência divina, desce por vezes do reino do informe para a contemplação de alguns aspectos da criação e a fim de não ser condenado, essa pessoa presta atenção ao seu corpo, não porque lhe tenha amor ou que deseje mantê-lo vivo, mas de modo a não torná-lo totalmente inútil (antes de tempo) e por essa razão incorrer em condenação.

Assim como o intelecto não rejeita as paixões que o cercam, mas usa-as de acordo com a sua verdadeira natureza, a alma não rejeita o corpo, mas usa-o para toda a boa obra.

Quatro princípios constituem esta sabedoria do agir do homem divino : o juízo moral, o autodomínio, a coragem e a justiça.

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 10

Discriminação

É importante ter um Mestre que tenha experiência e com ela a virtude da discriminação.
Infelizmente hoje em dia é quase impossivel encontrar destes Mestres.

Quem tem esta virtude sabe quando o tempo está maduro, quem não a tem pode se esforçar muito, mas não consegue grande coisa.

Quem a tem é capaz de comunicar o sentido do que diz , mesmo a quem não o quer ouvir ou que o recuse ,pois ‘o Espirito penetra ‘.
Mas sem a prévia humildade não se alcança esta virtude discriminatória.

Se humildemente pensarmos que temos de fazer algo de acordo com a vontade de Deus, devemos fazê-lo calmamente e mesmo se tal não é uma boa coisa (se não tivermos antes bem discriminado), o que fazemos será contado para o nosso crédito pela graça de Deus, por causa da nossa perplexidade (ausencia de má intenção) e o facto de que nós o termos feito com Deus na mente.

Porém quando a nossa vontade(sem humildade nem discriminação) está envolvida e não a de Deus, a arrogância (e não a inocência ) está presente e Deus não aprova nem nos revela sequer os sinais da Sua vontade , assim incorrendo nós em maior condenação.

Pois se Deus nos dá alguma coisa ou a retém de nós , Ele apenas age para o nosso bem, mesmo se nós, como crianças, não temos disso consciência.
Ele não envia o Espírito Santo a alguém que não se purifica das paixões através da prática das virtudes , para que essa pessoa pelo hábito de sucumbir às suas paixões , não se torne culpada de abusar da presença do Espírito Santo dentro de si.
A discriminação que nasce da humildade necessita de ter havido antes um longo tempo de prática, purificando o corpo do pecado dos sentidos e a sua alma de toda forma de desejo ou raiva.

Seus impulsos morais precisam ser disciplinados pelo bom hábito, de modo que ele não faça o que quer que seja através de seus cinco sentidos que seja contrário à finalidade de seu intelecto e do seu espirito interior .

É então, quando finalmente ele se torna sujeito a si mesmo, que Deus faz todas as coisas nele através do desapego e pela graça do Espírito Santo.

O homem deve primeiro se submeter à lei de Deus e só então pode governar como um ser inteligente sobre os todos ao seu redor ,começa a antecipar as armadilhas preparadas pelo diabo e começa a ver as coisas de acordo com sua verdadeira natureza.

Ele não é mais seduzido pela aparência das coisas como era antes.
Ele olha friamente sobre o ouro, prata e pedras preciosas e não se deixa enganar nem os avalia falsamente por causa das suas paixões.
Ele sabe que essas e outras coisas como tudo o que é material vêm da terra e a ela regressam.
Ele olha para o homem e sabe que ele também é da terra e vai voltar para ela.
Assim, com discriminação olhamos para a criação e para os nossos próprios pensamentos, sem estar cegos por qualquer ilusão ou por fazer qualquer coisa contrária ao propósito de Deus pela nossa sujeição às paixões .
Mesmo ameaçados de morte, não nos afastaremos de Deus em pensamento ou ação.

Com paciência, e não crescendo presunçosos ou ausentes de virtude, vamos ser levantados a partir do estado cadavérico do corpo e das coisas materiais para o conhecimento espiritual das realidades criadas.

Pela mortificação dos sentidos e do conhecimento real das coisas alcançamos o estado de desapego, crescemos na humildade e na discriminação e somos ressuscitados espiritualmente em Cristo .

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 9

Humildade

O desprendimento é a porta de entrada para o reino dos céus, quem passa por esta porta se aproxima de Deus, mas sem a humildade a estrada que leva a esta porta está cheia de dor e seu esforço será inútil.

O homem verdadeiramente humilde nunca deixa de se recriminar, mesmo quando todo o mundo o ataca e insulta.

Os demônios atacam mesmo aqueles cujo intelecto está concentrado inteiramente na contemplação de Deus e apenas com a sua humildade, fraqueza,ignorância e gratidão continua trazem Deus em sua ajuda.

Como se ganha a humildade?

Não é fácil, é algo além de nossas capacidades naturais, e é quase certo dizer que quanto mais uma pessoa é talentosa, quanto mais difícil para ela alcançar a humildade.
Ela pressupõe grande julgamento e resistência em face dos ensaios e espíritos malignos que se opõem a nós,pois a humildade pode escapar-se a cada cilada que se nos depara.
Passando por varios testes e experiências que nos enriquecem e fazem aprender.
Suportando-os paciente e persistentemente.
Adqurindo experiencia e conhecimento espiritual com eles .
Percebendo que afinal eramos e continuamos a ser ignorantes.
Admitir essa ignorância como uma fonte de humildade.
Percebendo por ela que somos criaturas mutáveis, que nada nos pertence mas tudo provém do Criador.
Exercendo o nosso livre arbitrio no sentido de sermos sempre gratos a Ele pelo que nos deu e nos dará , ao não agradecer apenas nos auto-condenamos pela nossa ingratidão.

O demônios atacam até mesmo o perfeito neste mundo, o pecado está sempre á espreita até à morte fisica, por isso nunca se deve abrandar a humildade vigilante mesmo que tenhamos subido a altos niveis do espirito.

A humildade que nasce do conhecimento espiritual é origem da discriminação, a virtude que ilumina os confins do intelecto, passa-se a ver as coisas de acordo com a sua verdadeira natureza, o intelecto morre ao mundo, porque agora contempla as criações de Deus.

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 8

A meditação sobre os sofrimentos de Cristo

Meditando sobre os muitos sofrimentos que o Senhor sofreu por nós, nos tornamos conscientes de nossa própria fragilidade e temos de dar graças pois , apesar de pecadores, foi-nos concedida a contemplação dessas coisas.

Desta forma, nos tornamos mais humildes e mais conscientes da nossa insignificância.

Nesta meditação não devemos esperar ver coisas ‘sobrenaturias’ ( quando surgem são mais prova do diabo que de natureza divina), como aparições de anjos ou de Cristo.
Quem pretende ver Cristo não deve olhar para fora de si mesmo, mas para dentro de si mesmo, imitando a vida de Cristo neste mundo, e tornar-se sem pecado em corpo e alma, como Cristo foi.

Seu intelecto deve apreender tudo através de Cristo.
Convém meditar orientado por alguem com experiencia para não ser iludido pelo diabo que nos engana com ‘aparições ‘ e outros devaneios e sob sua influência o nosso intelecto vagueia sem sentido em seus esforços para alcançar a perfeição.

Devemos também meditar sobre as coisas terríveis que aconteceram no início por causa da transgressão do homem, sobre como a nossa natureza sucumbiu a tantas paixões, sobre as nossas próprias falhas e os testes diários que ocorrem para nos corrigirmos e nos levantarmos.

Devemos pensar na morte e no temor dos castigos que esperam os pecadores após a morte.

Desta forma, a alma sai fortalecida , mais dedicada à contemplação e sem deseperar seja por faltas ou quedas terríveis, seja imaginando que alcançou certo nível de evolução espiritual, continuando humildemente com medo e esperança, num estado equivalente à suavidade , ao correr fluido do pensamento que é sempre o mesmo.

Essa meditação cria um conhecimento, sem o qual não podemos iniciar nenhuma pratica espirtual pois só ele torna essa prática eficaz, servindo assim como uma espécie de ferramenta; o conhecimento que se segue à fé protege a nossa fé com o medo como um muro de protecção.

A àvore do crescimento espiritual do homem é cultivada e mantida através do comhecimento,da pratica das virtudes e dos mandamentos pelo homem de fé , mas é regada pela divina providência, que atua como o sol, chuva e vento, sem os quais todo o esforço do jardineiro é em vão, mesmo se tudo tivesse sido feito na devida ordem , pois nada de bom pode acontecer sem a ajuda do Alto .

Mas não esquecer que a ajuda e a graça do Alto só surge àqueles que resolveram agir.

Nesta vida, todas as coisas vão em pares: prática e conhecimento espiritual, o livre arbítrio e graça, medo e esperança , luta e recompensa.
A segunda não vem até a primeira ser concretizada, e se isso acontece é uma mera ilusão, como alguém que não possua os conhecimentos de horticultura, ao ver a flor e pensando que é o fruto, corre para o apanhar , não percebendo que ao escolher a flor , destrói o fruto.

Por isso devemos fazer todas as coisas com discriminação,buscando conselhos com humildade e fazendo auto critica ao que se pensamos e fazemos.

Não há nada de surpreendente no fato de que o diabo assume a forma de "anjo de luz" e os pensamentos que ele semeia em nós, também nos parecem ser justos quando não temos experiência.

A humildade é a porta de entrada para o desapego e o combustivel da humildade é a suavidade impassivel.
É isso que dá constância ao homem, de modo que ele é sempre o mesmo sejam as circunstâncias e os pensamentos agradáveis ou desagradáveis.
Ele é indiferente seja para a honra ou para a desonra, alegremente aceita as coisas sejam doces ou dolorosas, permanecendo impassível.

Sem a discriminação que aprofundaremos mais adiante não se consegue separar os meios dos fins .
Esperar pelo fruto ( que representa a pureza do nosso intelecto em união com Deus ) adubando a arvore com a nossa paciente dedicação , deixando-a ser regada pelos elementos naturais que Deus providencia a seu tempo e não se precipitar a apanhar a flor antes de tempo é esse o nosso dever e caminho .

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 7

A mortificação das paixões

Aquele que alcançou o desapego das coisas materiais tem sua atenção sempre fixa em Deus através da contemplação das coisas impressionantes que acontecem antes e depois da morte.

E recebe por graça o ensinamento sobre estas coisas, para que através do sofrimento interior (ao pensar e reflectir nessas coisas), possa mortificar as paixões e, na altura devida , alcançar a paz e mansidão em seus pensamentos.

Renuncia às alegrias deste mundo porque começa a ver que os seus defeitos são incontáveis como a areia do mar.

Este é o começo da iluminação da alma e o sinal da sua saúde.

As lágrimas e os pensamentos aparentemente divinos que podem ocorrer antes são todos enganos e artimanhas dos demônios, principalmente no caso daqueles que vivem entre os homens, ou sujeitos a distração, mesmo leve que seja.

Ninguém que ainda se sinta atraído por qualquer objeto sensível pode superar as paixões.

Deus, por vezes, ‘deixa ‘ que sejamos ‘distraidos’ por ‘coisas vãs’ para não sermos tentados por coisas ainda piores , é uma forma de ‘mal menor ‘ e Ele pode actuar nesse sentido para a nossa saude espiritual.

Mas aquele que pela graça de Deus alcançou um certo grau de conhecimento espiritual e pode entender as coisas incríveis que ocorrem antes e depois da morte, a queda do homem pela sua desobediência, deve continuar em quietude e desprendimento a ocupar-se com tais pensamentos e não deve deixar-se distrair com ‘coisas vãs’.
"Na verdade tudo é vaidade, e a vida é apenas uma sombra e um sonho."

Preocupamo-nos e ‘apaixonamo-nos’ pela nossa vida e coisas deste mundo em vão, pois o que pode ser mais inútil e vão que uma vida cujo fim é a putrefação e poeira?

A mortificação não é do intelecto, mas de impulsos para o prazer e conforto.

Porque o desejo de conforto, mesmo ligeiro, é um desejo não-espiritual.
E quando a alma se já encontra em actividade totalmente espiritual , ela sente um desconforto ainda maior com a presença deste desejo não-espiritual, pois se a alma ainda tem actividades não espirituais, o Espírito de Deus não irá habitá-la.

Quando um homem esclarecido percebe os seus próprios erros , ele não cessa de se lamentar por si e por todos os homens, vendo a grande paciência de Deus e os pecados que nós, na nossa miséria cometemos insistentemente.

Como resultado disso, ele fica cheio de gratidão e não se atreve a condenar ninguém, envergonhado pela profusão de bênçãos de Deus ,pela sua ingratidão e pela multidão das suas faltas.

Então, ele renuncia a tudo que seja contra a vontade de Deus e está atento aos seus próprios sentidos, de modo a impedi-los de fazer algo para além de o que é inevitavelmente necessário.

Mas depois de ter alcançado tais alturas, ele deve ser cuidadoso para evitar negligência ou arrogância, pecar é fácil, enquanto que o arrependimento é dificil.

Cuidadoso para não cair, mas se cair, que se levante novamente.
Ao cair não devemos desesperar e assim afastar-nos do Senhor, pois, se assim O desejar, Ele pode lidar com misericordia com a nossa fraqueza.
Não devemos é nos desligamos d’Ele quando nos sentimos constrangidos pelos Seus mandamentos, nem devemos perder o ânimo quando ainda estamos aquém do nosso objetivo.
Em vez disso, vamos aprender a dar tempo ao tempo , a não ser apressados e estar sempre prontos para fazer um novo início.

Se cairmos, levantamo-nos de novo.

Só não devemos nunca abandonar o nosso médico em desespero.

Espere por Ele e Ele será misericordioso, vai transformá-lo ou enviar novas provas , através talvez de alguma outra maneira que você desconhecia , ele é o mestre das surpresas.

É preciso atenção constante e termos a graça de discriminação para discernir entre as obras de Deus e as obras do diabo , aquele que tem o dom de discriminação recebeu-o pela sua humildade.

Por ela, ele conhece todas as coisas pela graça e, quando o tempo está maduro, ele alcança o discernimento espiritual.
Pelo desprendimento morremos para o mundo.

Também podemos morrer para o mundo, suportando pacientemente e não desesperando quando vemos á nossa volta desânimo e morte, nem estando com confiança orgulhosa por termos alcançado o nosso objetivo.

Assim na nossa humildade nos considerarmos como inferiores a todos os outros homens e percebemos as bênçãos que recebemos por meio da graça de Deus .

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 6

Desprendimento

Desprendimento tem sua origem na esperança, pois quem espera para adquirir a riqueza eterna em outro lugar facilmente despreza o que é material e transitório, mesmo que lhe ofereça todo o tipo de conforto.

Embora a sua vida possa ser dura e cheia de dor, que pode persuadir um homem de inteligência para o valor da riqueza material acima do amor de Deus, que dá as duas formas de riqueza para aqueles que O amam?

Isto só poderia acontecer aos cegos e incapazes de ver, tudo por causa de sua falta de fé ou por causa de sua má índole e hábitos.

Mas o Senhor disse que poucos são salvos (cf. Lucas 13:23-24).

Todos aqueles que são os escravos da paixão sofrem da mesma forma por causa de sua falta de consciência, e mesmo se eles resistem por um tempo eles são novamente vencidos pelo hábito.

Por esta razão, o Senhor diz: "O reino dos céus é vítima de violência" (Mt11:12).

Essa violência é devida, não à nossa natureza, mas da nossa intimidade com as paixões.

Se tivesse sido devido à nossa natureza, ninguém iria entrar no Reino.

Para aqueles que escolheram o Reino , no entanto, o jugo do Senhor é fácil de suportar e Seu fardo é leve (cf. Matt. 11:30), enquanto para aqueles que não fizeram esta escolha, "é estreita a porta e apertado é o caminho" (Mt 7:14) .

Para aqueles que o escolheram o Reino está dentro e próximo a eles, porque eles o desejam e desejam alcançar aqui e agora o estado de Desprendimento .

O que ajuda ou atrapalha a nossa salvação é a vontade, e nada mais.

Se você quer fazer algo bom, faça isso, e se você não puder fazê-lo, então tome essa resolução e terá alcançado uma resolução, mesmo que não realize a própria acção.

Assim, um hábito, bom ou mau, pode gradual e espontaneamente ser superado.

Todos os homens são obrigados a manter mandamentos, porque eles pertencem a nossa natureza, isto é, todos nós somos chamados a amar a Deus e ao próximo, a suportar pacientemente o que nos acontece, para fazer uso das coisas de acordo com sua verdadeira natureza e devem se abster de cometer o mal.

Devemos manter estes mandamentos, mesmo que não queiramos.

Com efeito, a menos que os conservemos , não vamos encontrar a paz, mesmo neste mundo, pois as leis punem aqueles que os não cumprem e as nossas autoridades nos obrigam a viver virtuosamente.

Como diz São Paulo, o governante 'não carrega a espada sem nenhum propósito "(Rm 13:4), e novamente:" Você gostaria de não ter nenhum medo de autoridades?
Faça o que é certo e você vai ter a sua aprovação .

O soldado de Cristo tem de fazer aquilo que está além da natureza, por esta razão ele deve provar os sofrimentos de Cristo, para que ele possa atingir também a Sua glória.

Na verdade, esta também é uma lei da natureza, verificada pelo que acontece neste mundo.

Não são os soldados do rei honrados porque sofrem com ele?
E que cada um deles recebe elogios em proporção à sua dedicação ?
E na medida em que ele se mostra incapaz de sofrer e se dedicar desta forma, ele não é desonrado?
Não é óbvio que quanto mais imponentes as vestes de uma pessoa, tanto mais perto ela está do rei?
E quanto menos imponentes mais distante?

A mesma coisa se aplica em relação ao nosso próprio Rei.
Quanto mais sofremos com Cristo e imitamos a sua pobreza, pensamos nos seus sofrimentos e os maus-tratos a que foi submetido antes de ser crucificado por nossa causa e foi sepultado, mais íntimos com Ele nos tornamos e mais compartilhamos em Sua glória.

É como diz São Paulo: Se sofrermos com Ele, com Ele seremos glorificados.

Muitas pessoas sofrem, para ganhar a vida neste mundo, muitas provações e ausencias de casa mas nós não nos dispomos a suportar as dificuldades, mesmo leves pelo reino dos céus e da eterna bênção.

Isso não seria difícil de atingir, se a nossa resolução fosse firme e se vissemos essa aquisição de virtudes não como uma tarefa trabalhosa e intolerável, mas sim como uma alegria e um prazer e uma fonte de libertação da ansiedade e honra que surgem quando as virtudes são adquiridas.

Por fim, a virtude nos traz felicidade e exultação.

Na verdade, o Desprendimento é cheio de alegria, assim como a existência material e suas vergonhosas paixões estão cheias de tristeza.

Que possamos ser resgatados a partir desta existência material e que possamos alcançar vida eterna, imaterial através do Desprendimento que leva à mortificação do corpo .

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 5

Esperança

A vida é esperança livre de toda a ansiedade .

Todos olham para a frente com esperança, trabalhando com alegria.

Exteriormente sacrificam-se vantagens imediatas, mas, na realidade, mesmo tendo em conta o que se sacrifica, através da perseverança ganha-se o que é de valor muito maior.
No dia a dia sabemos por experiência que temos a ganhar alguma coisa, enquanto que no reino do espiritual ninguém ressuscitou dos mortos, para que possamos saber se podemos esperar recompensas.
É, no entanto, só porque não temos experiência dos dons espirituais e do conhecimento espiritual que pensamos assim.
É por isso que o profeta diz: "Fizeste-me habitar em esperança".

Quem quiser herdar o reino dos céus, mas não suporta pacientemente o que lhe sucede, mostra-se ingrato , pois foi criado por graça de Deus e dele recebeu todas as coisas neste mundo.
Tendo o homem espiritual uma forte esperança e adquirido a quietude na sua vida, pode ser por Deus recompensado nesta vida presente, quanto á vida futura‘’o coração do homem não compreendeu ainda as coisas que Deus tem preparado para aqueles que o amam’’ e que renunciam à sua própria vontade na paciência e na esperança das bênçãos ainda por revelar.

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 4

Paciência persistente

O Senhor disse: "Aquele que perseverar pacientemente até ao fim será salvo" (Mt10:22).

Paciência perseverante é a consolidação de todas as virtudes, porque sem ela, nenhuma delas pode subsistir.

Quem volta para trás e não perservou até ao fim escapando às continuas armadilhas do diabo não é "apto para o reino dos céus" (Lucas 9:62).

Tudo requer persistencia uma vez que mesmo as coisas sensíveis não podem ser produzidas sem ela: quando tal coisa nasce, tem que haver um período de espera paciente, se é para continuar a frutificar .

Em suma, a paciência é necessária antes que qualquer coisa possa acontecer, e, uma vez que algo tenha acontecido, isso só pode ser sustentado e levado à perfeição somente através de tal persistência.

Se é algo bom, essa virtude assiste e guarda, se é algo mal, confere conforto e força de alma e não permite que a pessoa desanime e tenha uma antecipação do inferno.

A paciência persistente mata o desespero que mata a alma, ela ensina a alma a ter conforto e não crescer apática diante de suas muitas batalhas e aflições.

São Basílio nos aconselha a não lutar contra todas as paixões de uma só vez, pois se nós não tivermos sucesso nessa multipla tarefa, podemos recuar, cair demais e não ter mais forças para nos reerguermos em direcção ao reino de céu.

Pelo contrário, devemos combater as paixões uma a uma e começar por suportar pacientemente o que nos acontece.

Isto é acertado, pois a pessoa que carece de paciência nunca será capaz de manter-se firme, mesmo numa batalha normal, pois vai apenas trazer conflito e destruição sobre si mesmo e sobre os outros, em recuando.

Numa guerra comum, é possível ficar dentro de casa e não sair para lutar e, embora perdendo por isso presentes e honrarias, pode-se viver em pobreza e na desonra.

Mas na guerra espiritual é impossível encontrar um lugar onde uma batalha não é travada.

No deserto há feras e demônios , em lugares de solidão e silêncio há demônios e tentações, no meio da sociedade humana, existem os demônios e também os homens que nos tentam todos os dias .

Não há nenhum lugar onde se esteja sem ser molestado e, por isso, sem paciência persistente é impossível encontrar a paz.
Esta paciência persistente nasce do medo e da fé , embora se origine na compreensão.

Com ela aceitamos correr riscos corporais na vida presente, assim, atingindo o estado de desapego e reinarmos com Cristo espiritualmente nesta idade e na proxima, ou então, cair com medo dos julgamentos e sermos condenados a castigos eternos.

Que Deus nos dê força para suportar pacientemente tudo o que de terrível nos possa acontecer.

A paciência persistente é como uma rocha inabalável aos ventos e às ondas da vida.

Mesmo quando as tempestades se abatem sobre ele , o homem paciente permanece firme e não vacila e quando encontra alívio e alegria, ele não se deixa levar pela glória pessoal: ele é sempre o mesmo, quer as coisas sejam difíceis ou fáceis e por isso ele é um testemunho contra as ciladas do inimigo.

Quando as tempestades surgem , ele suporta-as com alegria, esperando o seu fim, e quando o céu sorrie para ele, ele espera que a tentação surja até ao seu último suspiro .

Tal pessoa sabe que nada na vida é imutável, e que todas as coisas passam.

Assim, ele não está perturbado ou ansioso sobre qualquer coisa, mas deixa tudo nas mãos de Deus, pois Ele nos tem em seu cuidado .

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 3

A verdadeira piedade e auto-controle

É possível temer ao Senhor antes de acreditar Nele?
Não se tem que acreditar primeiro para depois sim se temer aquilo em que se acredita ?
Daí que a fé, o acreditar, dê lugar ao medo e do medo surge a verdadeira piedade.

Deixando de lado as práticas ascéticas que pertencem ao corpo e que antecedem a aquisição tanto do maior tipo de fé e do puro medo ,eu vou falar brevemente sobre as virtudes da alma.

Destas a mais abrangente é o auto-controle, em duas fases , primeiro sobre as paixões e depois sobre os pensamentos.

Há também uma outra forma mais parcial do auto-controle, que se aplica a ações corporais e nos ensina o uso adequado de alimentos e bebidas.
Aqui, no entanto, estou referindo-me ao auto-controle que se aplica, como eu disse, às paixões e a cada pensamento e movimento corporal que não esteja em harmonia com a vontade divina.

Quem se empenha nesta virtude do auto controle vê as provações e as tentações incitadas pelos demônios (não algum diabinho exterior de cornos afiados mas sim as nossas próprias resistências interiores) se multiplicar , porque vêem diante deles um anjo encarnado, sinceramente empenhado em fazer o que é certo e bom.

Isto é o que se entende pela ordem dada ao homem no paraíso, "cultiva e guarda" (Gn 2:15); deste auto-controle que precisa ser cultivado e guardado incessantemente, de modo a evitar qualquer das paixões que estão fora do jardim ,de mansinho rastejar de novo para dentro dele .

As duas formas de auto-controle não são idênticas, enquanto a primeira refreia as paixões, a segunda controla até mesmo o menor pensamento mantendo-o sob vigilância para que não o conduza ao pecado mas sim a Deus.

É preciso prática, experiência nesta aquisição das virtudes através de muito esforço e durante um longo período de tempo.

Isto é especialmente verdadeiro para as virtudes da alma, pois estas são as virtudes mais introspectivas e essenciais.

As virtudes que dizem respeito ao corpo - que são melhor descritas como as ferramentas das virtudes - são mais fáceis de adquirir, mesmo se exigem esforço corporal.

Mas as virtudes da alma, embora eles exigem o controle do pensamento por si só, são muito mais difíceis de alcançar.
É preciso dar atenção persistente e paciente aos nossos pensamentos, de modo a ganhar experiência de nossas muitas provações e batalhas e, assim, nos tornarmos marinheiros experientes, se não mesmo capitães da nossa vida.
Quem não está atento está cego e até diz que vê .
É por isso que é dito’’que eles serão julgados mais severamente (cf. (João 17:22).

Se nós reconhecemos a nossa cegueira, já é um bom sinal, mas é importante também no dia a dia da nossa vida sermos gratos, admitir as nossas falhas e a nossa ignorância, repreender a nós mesmos, pois é vergonhoso até mencionar as coisas que fazemos em segredo (sem auto controle).

Mestre Eckhart dizia : ‘Se todos os dias disseres obrigado , já é bastante‘.

Aquele que deseja manter a posse de auto-controle , deve primeiro ser mestre de si mesmo seja externa ou internamente, agindo como se já estivesse morto na alma e no corpo em relação a este mundo e todos os outros homens.

Em todas as circunstâncias, ele deveria dizer para si mesmo:

Quem sou eu?
Que é a minha existência?
Nada, apenas abominação. Começo da terra e termino como putrefação e entre as duas estou cheio de todos os tipos de insolência .
O que é a minha vida?
E por quanto tempo?
Uma hora e a morte vem.
Por que me preocupar com isto e aquilo?
Já estou morrendo pois só Deus controla a vida e a morte.
Por que eu me preocupo e me esforço em vão?
Tudo o que preciso é um pouco de pão, porquê procurar mais?
Se eu tiver isso, não há nada mais para me preocupar.
Se eu não tiver , pode ser que, na minha ignorância, eu me preocupe, mas é sempre Deus quem dá aquilo que eu preciso.

Por estas razões, todo homem deveria ter como única preocupação guardar os seus sentidos eseus pensamentos, de modo a não conceber ou fazer qualquer coisa que não possa estar em conformidade com a vontade de Deus .

Deve-se preparar para aceitar pacientemente as coisas que lhe acontecem pelas mãos de homens e demônios, quer estas coisas lhe sejam agradáveis ou desagradáveis.
Nem uma nem outra deve excitá-lo e mergulhá-lo seja em alegria insensata e presunção ou em melancolia e desespero.

Ele não deve ter nenhum pensamento de excesso de confiança até que o Senhor entre em sua casa.

Os Discursos de Pedro de Damasco --Parte 2

Os dois tipos de medo

Como a fé, o medo de sermos pecadores ( não levarmos a vida que sentimos dever levar no sentido espiritual ) é de dois tipos: o primeiro é introdutório, enquanto o segundo, que cresce a partir do primeiro, é perfeito.

Quando ele está ativo dentro de nós, esse medo introdutório nos ensina o caminho que conduz à vida, pois é dito: "afasta o mal e faz o bem" (Sl34:14).
Quanto mais um homem se esforça para fazer o bem, mais o medo cresce, até das faltas mais leves que ele pensava que eram insignificantes enquanto ainda estava nas trevas da ignorância.

Ao temer desta forma o medo se torna perfeito, ele próprio se torna perfeito através do sofrimento interior: ele não mais deseja o pecado, mas, temendo o retorno das paixões, ele permanece nesta puro medo invulnerável.

Como o salmo diz: "O temor do Senhor é puro e permanece para sempre" (Sl19:9. LXX).

O primeiro tipo de medo não é puro, pois surge em nós por causa dos nossos pecados.

Mas, independente do pecado, a pessoa que foi purificada continua a sentir medo , não porque peque , mas porque, sendo humana, ela é mutável e propensa ao mal.

Em sua humildade, quanto mais avança através da aquisição de virtudes, mais ela teme.
Isso é natural, pois quem possui riquezas tem medo de as perder, existe sempre medo da perda,
da punição, da desonra, e da conseqüente queda do seu grande património.

O sinal do primeiro tipo de medo introdutório é o ódio do pecado e da raiva em direção a ele, como alguém que ferido por uma besta selvagem .

O sinal de medo perfeito é o amor da virtude e o medo da recaída, já que ninguém é inalterável.
Assim, em cada situação ao longo da vida presente, devemos sempre ter medo de cair.

"Bem-aventurado o homem que teme ao Senhor e quem muito preza os seus mandamentos ", ou seja, que muito preza a virtude.

Tal pessoa tem o status de um filho, pois ele preza a virtude não por medo de punição, mas por causa do amor que lança fora o medo ".

É por isso que ele tem grande prazer, ao contrário do escravo que executa ordens sob pressão por causa do seu medo da punição.