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domingo, 27 de dezembro de 2009

As garrafinhas do demónio



O abade Macário vivia num lugar muito desértico; estava sozinho na sua solidão.

Havia outro lugar isolado mais abaixo no deserto onde viviam vários irmãos.

Um dia, Macário olhou para fora e viu o demónio com forma humana a passar na estrada, usando uma túnica velha de linho com muitos bolsos, e de cada bolso saía uma garrafinha.

"Hei, meu amigo, para o onde é que tu vais?" perguntou Macário.

"Eu vou-me encontrar com os irmãos", respondeu.

"Para que são essas garrafinhas?" perguntou o ancião.

"São pequenas amostras para os irmãos provarem", respondeu.

"Parece que tu tens aí gostos para tudo." disse o ancião.

"Tens toda a razão", disse ele. "Se alguém não gostar de uma eu ofereço-lhe outra, e se não gostar dessa eu ofereço-lhe uma terceira, e por aí fora ofereço-lhe todas, porque se não gostou de todas pelo menos haverá uma que gosta".

Tendo dito isto continuou o seu caminho.

O ancião manteve-se atento à estrada até que ele reapareceu, e quando estava perto disse-lhe, "Espero que tudo tenha corrido bem contigo".

"O que sabes tu do 'bem'?" perguntou ele.

"Mas que queres tu dizer com isso?" perguntou o ancião.

"Quero dizer que eles todos se tornaram tão santos que ninguém me quis dar ouvidos", respondeu ele.

"Então tu não tens amigos nenhuns lá em baixo?" perguntou.

"Eu só tenho um dos irmãos", respondeu. "Ele foi o único que me ouviu, embora eu tenha que reconhecer que ele veio a correr para mim como o vento assim que me viu".

"Como é que ele se chama, gostava de saber", perguntou o ancião.

"Teótitus", respondeu ele enquanto prosseguia o seu caminho.

O abade Macário imediatamente se levantou e foi para o deserto inferior, e cada irmão preparou a sua cela para o caso de Macário querer ficar nela.

Mas o ancião perguntou qual de entre eles naquele lugar se chamava Teótitus, e quando soube onde ficava a cela dele, foi até lá.

Teótitus saudou-o com alegria.

Quando eles puderam conversar em privado, o abade Macário perguntou-lhe, "Como vão as coisas contigo, irmão?"

E ele respondeu, "Oh, vão bem, graças às tuas orações".

E o ancião perguntou, "Tu não tens nenhuns pensamentos perturbadores?"

"Não, eu estou bem de momento", respondeu.

Mas ficou vermelho quando respondeu, e o ancião disse, "Bem, eu não sei há quantos anos estou nesta vida, e todos me respeitam, no entanto mesmo já idoso eu ainda sou perturbado com tentações sexuais".

E Teótitus respondeu, "Podes crer, pai, que também eu".

E o ancião fingiu que era vítima de muitos outros maus pensamentos, por forma a levá-lo a confessar.

Finalmente disse, "Quanto tempo estás tu de jejum hoje?"

"Até à nona hora", respondeu.

"Jejua até mais tarde", disse o ancião, "e sê abstinente, lê as Escrituras, aprende-as de cor, faz com que os recessos mais profundos da tua mente meditem nas Escrituras, e se algum pensamento mau aparecer na tua mente, não te submetas a ele mas antes sobrepõe-te a ele, e Deus virá imediatamente em teu auxílio".

Tendo dado esta ajuda ao irmão, ele regressou à sua solidão.

Mais uma vez viu o demónio e perguntou-lhe para onde ia, e o demónio respondeu que ia ter com os irmãos.

E quando ele regressou, o ancião perguntou, "Então, como estão a passar os irmãos?"

"Terrivelmente", disse o demónio.

"Como assim?" perguntou o ancião.

"Eles tornaram-se completamente santos", respondeu, "e pior é que aquele amigo que eu tinha que me ouvia também foi subvertido, não sei como. Não apenas ele não me ouve, mas também se tornou mais santo que todos os outros. Assim, eu jurei que não vou gastar as solas dos meus sapatos por aqui outra vez por um longo período".

O demónio deixou o ancião e pôs-se a caminho, enquanto o santo ancião regressou à sua cela adorando e agradecendo a Deus seu Salvador.

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