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domingo, 2 de janeiro de 2011

A Criação na teoria Sufi - Parte 5 e Final


O Juizo Final, a morte fisica e a finalidade da Criação

O Juizo final é a leitura do livro por cada um de nós,da nossa vida, onde os maldosos, ignorantes e descrentes afinal descobrem a sua natureza superior e onde os homens se julgarão a si proprios, em Deus, em função do exercicio da sua parcela de livre arbitrio (uma gota de agua no oceano da Omnipotência do Criador), a liberdade existe enquanto usada no interior da Realidade, fora Dela auto anula-se e o homem decai, prisioneiro da sua escolha ilusória.

Para o sufismo a morte fisica é o terminar de uma experimentação de uma multiplicidade de estados,na periferia do circulo, até ao momento do refluxo,do regresso á origem, ao Centro que está em toda parte.

A dissolução individual é semelhante e prefigura a dissolução ciclica do cosmos.

Viver a efemeridade da nossa vida não deve ser associado com dor ou tragédia porque viver o passageiro é realizar a essência profunda da Existência.

Para o Sufi na morte fisica é removido o véu ,para aqueles que não o fizeram em vida,que cobre a Realidade e TODOS sem excepção, vêem a sua verdadeira natureza,TODOS conhecem a Deus no momento da sua morte fisica.

A morte é apenas mais um acto de Misericórdia Divina que deu a existência ao mundo e que na morte fisica dá uma oportunidade a TODOS.

O nascimento é uma morte espirtual, a morte um renascimento do espirito .

Na morte,o homem é testemunha da Presença Divina em si ,obtém consciência dos Atributos Divinos que possui e sabe verdadeiramente o que era estar vivo.

O mestre Sufi Al-Hallaj na véspera de ser executado disse :

-- Matai-me, ó meus amigos, pois,no ser morto, está a minha vida!.

No instante da morte cada um realiza ,de acordo com a vida que levou na terra,a junção dos opostos e vê quanto a sua vida respeitou a Realidade.

Cada um sabe , nesse momento, quanto afastado de Deus esteve na vida,por incúria ou submissão cega às paixões .

Sabe qual é a proporção entre as perversidades e as formosuras do seu caracter.

Na morte acaba o véu do corpo em relação à Realidade e TODOS verão a visão verdadeira.

Allah diz no Corão a quem morre : Hoje levanta-se a cobertura e a tua visão será perfurante!

Quem não ‘encontrou’ Deus em vida, é confrontado com esse erro que ‘deforma’ o seu Eu superior,que o torna ‘feio‘.

O Inferno e suas penas é esse momento de intenso sofrimento que passam os que ‘não encontraram’ por ou ‘não procurarem’ ou nem ao menos terem vivido em paz (salam) ou submissão (islam).

O homem desce ao fundo da sua propria vileza para alcançar a natureza do seu mal.


O Inferno é Real ?

Para o danado é-o de certeza,pois se confronta duramente com si mesmo,com a mentira da sua vida e com a Verdade Real , para ele é real e interminável.

Para quem vê de fora ....é uma mera ilusão , paradoxo divino
No sufismo o inferno é o afastamento ou privação da Realidade Absoluta ou Ipseidade Divina.

Como diz o poeta argentino José Luis Borges, o inferno real é o homem não se conhecer nem conhecer o seu destino.

Maomé disse uma frase sobre este tema : ‘A morte abre uma ponte que cruza o inferno que ‘cada um criou’,larga para quem reconheceu o Ser na sua vida,mais fina que o gume de uma espada para quem venerou apenas o seu eu pequeno’.

O Ser Uno quer ser ‘conhecido’ por um ‘conhecedor’e para isso existe o homem.

Se o homem ‘não encontra’ Deus na sua vida, ‘frusta‘ esse ‘conhecimento’ e isso é um ‘desvalor’ enorme no momento da morte, do Juizo final pois ‘falhou’ a finalidade para que foi criado.

Nesse ‘falhanço’ recebe não os seus Atributos Divinos mas a sua imagem invertida, essa imagem invertida ( torna-o predador,satânico,dominador) determina o aparecimento dos Atributos do Rigor de Deus que são a expressão causal da Sua Ira.

Esta Ira, mesmo como Atributo Divino, não possui natureza emocional pois trata-se de repor o equilibrio perdido, é a balança da Justiça Divina.

Percebe-se que o mal(desvalor) do castigo não é senão a expressão da Misericórdia, já que só mediante o mal e através da pedagogia da pena pode o homem conceber o Bem e que aqui a Ira Divina (Não-Misericórdia) é ainda e apenas Amor como um pai que castiga um filho.

Como diz um sufi : ‘Podemos desertar da nossa deiformidade (imagem de Deus) aproveitando as vantagens mas não podemos escapar às consequências que ela implica’.

O sufi Al-Gazali afirma : ‘No dia do Juizo serão abertos os livros ,montada a balança porque o único valor do homem reside no que fez no passado e será tarde demais para indemnizar o mal causado pelas suas faltas.

O cálice da morte é amargo para quem em vida ‘não encontrou’ o Ser pois nesse cáilice saboreia-se a Verdade e sofre-se o seu tormento.

Quem ‘não encontrou ‘ vê o horrendo que corporizou em contraste, insuportável,com a Beleza da sua realidade transcendente.

Por isso, os hipócritas, os que mentem a si proprios, são na concepção islâmica, os que mais duramente se penalizam.


As penas do Inferno são eternas ?

Não, porque eterno só existe Um.

Porque antes da Ira Divina existe sempre a Misericórdia Divina.

Porque a liberdade do homem move-se na estreita faixa consignada na determinação arquétipa.

A eternidade temporal das penas e do sofrimento é função da consciência e percepção espiritual que cada um desenvolve, ao iniquo parece-lhe uma eternidade perpétua face ao confronto a que é exposto mas na Realidade é um tempo finito.

Nalguns trechos do Corão fala-se no tempo interminável (do ponto de vista de quem o suporta) do castigo,noutros fala-se ‘até que o Senhor o deseje’ (11:107) ou apenas por um tempo limitado (2:80-81).

Ibn Arabi afirma a finitude do inferno e do paraiso : ‘Ambas as situações(na verdade dádivas divinas) regressarão à Misericórdia no final ‘.



No Corão se diz : Uma parede com uma porta existe entre o Paraiso e o Inferno, a face não-manifesta dessa porta (interior) é o Paraiso da Misericórida ,a face manifesta(exterior) será o Inferno do castigo.

Ibn Arabi diz : O paradoxo da Misericórdia Divina é que ninguém nem nada pode ser definitivamente mau, uma vez que tudo provém de Allah , tudo é por essência, no final supremo, destinado à Bondade e ao Bem.

O paradoxo da obediência ser uma Perfeição onde se manifestam os Nomes Divinos,Misericórida e Generosidade mas também da desobediéncia ser outra Perfeição com os também Nomes Divinos como o Vingador e Castigador.

Nascimento e morte são processos de expansão e contracção, uma série de ‘acidentes‘ da Essência Una que , apesar de não poder ser ‘alterada’ pela sua propria definição Una, de uma certa forma A espelham e refletem na sua infinita capacidade e potencial arquétipo.

Para quê ?

Como diz uma lindíssima frase sufi :

Para que sendo ‘conhecida’ e Amada, nos Amasse também.

Nós existimos para ter consciência da ligação ao Todo, para afastar o véu que nos cobre a Realidade, para sacrificar a vida sem a ela renunciar, no sentido de podermos ver com os ‘dois olhos’ a Realidade por detrás do aparente real.

Deve ser este o nosso ritual de vida,realizá-lo ou falhá-lo é a diferença entre Paraiso e Inferno.

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