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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

As estações iniciáticas da Ascenção e do Retorno



Ibn Arabi foi um importante místico sufi, filósofo, poeta, viajante e sábio hispano-muçulmano do al-Andalus. (1165 Murcia/Espanha-1240  Damasco/Siria), um dos livros que escreveu foi a 'Epistola das Luzes - Dos segredos outorgados áquele que está em retiro',  donde se retiraram os temas que se seguem.



As estações iniciáticas da Ascenção e do Retorno

A Ascenção (evolução espiritual) tem vários niveis-planos-estações, sendo a mais elevada a estação da ‘não-estação’ onde apenas existe uma porta que (ao contrário das anteriores) não se abre, e que é o véu que impede a visão da Essência Ultima Divina, incogniscível para o homem-criatura de Deus.   

‘A mais elevada das Tribos humanas é a dos que não têm estação’, pois nas estações inferiores os homens são condicionados por eles mesmos (existem objectivos-metas que se buscam, se alcançam, se mudam, ou cessam de existir), ao invés da mais elevada onde o único condicionador é Ele (e Ele não tem em Si nenhum objectivo cujo fim o seu Ser possa alcançar e quem atinge essa não-estação está perante Ele e é tudo, não existe finalidade nem nada mais na sua contemplação).

O homem que atinge a estação da ‘não-estação’ é dominado pelo seu estado, de modo a só saber por meio dele e ele ser-lhe atribuido e ser por ele designado.


Também se diz ‘estação’ porque o caminhante faz ‘alto’ (se firma, se fixa, adquire em permanência os atributos dela) nela (como o comboio quando pará, se imobiliza nas estações) e só se sobe de estação quando a anterior ficou bem ‘adquirida-fixada’.

A cada estação os seus atributos, as suas propriedades, os seus Mensageiros (Jesus, Moisés, Abraão, etc).
‘O meu mestre foi do tipo de Jesus no seu final,, enquanto eu o fui no meu principio e em seguida me transferi para Moisés e no fim da minha Via iniciática para Muhammad’.


As relações das estações com o homem ( o Muhamediano) que atingiu a não-estação é a mesma que Deus tem com seus Nomes.
Deus não é designado por nenhum Nome, assim como o Muhamediano não é designado por nenhuma estação.
Deus em cada  sopro, tempo ou estado, toma a forma requerida por esse sopro, tempo ou estado, mas a sua delimitação não perdura, porque as propriedades divinas se diversificam em cada tempo, e Ele diverge de acordo com a diversidade delas.
‘Deus está cada dia numa nova tarefa, flutua como o coração’.   

Pois o coração flutua nos estados e tarefas, continuamente, com cada alento.

Existem vários niveis quer no Paraiso (vários ‘Jardins’) quer no inferno (vários ‘fornos’) consoante o nivel de evolução de cada ser humano.


Em cada nivel dos ‘Jardins’ produz-se em continuo uma nova criação e novos prazeres (que nada têm a ver com os prazeres mundanos).

Deus produz esse processo de criação continuo para que os seres que nele residem se percebam, em continuo, de novas formas ou ‘objectos’ que nunca tinham visto antes e se alegrem (por Deus e em Deus e não por eles) e com isso o seu ‘apetite’ espiritual (de estar com Deus e em Deus)  aumenta.  

Igualmente em cada nivel dos ‘fornos’ existe em continuo um processo de transformação pelo fogo das ‘cascas’ dos apegos mundanos para que os que nele residem sintam esse Fogo e alterem as suas ‘crenças’ no sentido da purificação e da mudança para começarem a ‘ver’ o que antes não viam e se libertarem desses niveis ‘infernais’ e ascenderem na escada espiritual.

Estes niveis existem de ‘raiz’ no plano da Criação (desde sempre), pois Deus Oferece-se aos seres humanos, conforme a realidade do seu grau de evolução (o seu grau ontológico), a fim de se opor à permanência (deles num nivel fixo, imutável e eterno) e para que eles se mantenham também contrários a essa permanência (pois a Genese ‘não conhece repouso’ e o tédio não existe).        




O texto seguinte mostra a elevação espiritual deste grande Mestre. 
  
’Numa estação já elevada, existem espiritos em contemplação.

Não te detenhas lá, continua e avistarás uma Luz (e ouvirás melodias celestes) na qual não verás senão a ti mesmo, serás tomado de êxtase sublime, terás um deleite em Deus antes desconhecido, sentir-te-ás pequeno e humilde e tremerás como a chama de uma candeia.

Não te detenhas, continua e novos véus se erguerão e cairão, avistarás novas formas de glorificação e verás a tua forma entre elas, e por ela saberás o estado mistico onde te encontras.

Não te detenhas, e avistarás o leito majestoso da Misericordia, onde tudo se encontra, busca-te aí e quando te encontrares, reconhecerás o teu fim, a tua morada espiritual e o teu grau terminal. Saberás aí qual é o Nome divino que é o teu Senhor, qual a parte de gnose e amizade divina que te cabe e a forma da tua particularidade.

Não te detenhas, e avistarás o Mestre e instructor de todas as coisas, verás o seu traço, conhecerás a sua mensagem, observarás como ele se inverte, como recebe e como diferencia os seres.

Não te detenhas, e serás ocultado, aniquilado, erradicado até os traços dessa ocultação terem produzido em ti todos os seus efeitos, aí serás Afirmado, tornado Real, reunificado e de novo ocultado e revestido com as vestes de honra.

Em seguida, regressarás pelo teu caminho e reverás tudo o que havias visto, mas com formas diferentes, até voltares ao mundo sensivel, a menos que fiques retido (al-waqif, aquele que se retém, como Abu Iqal que era «louco», e que não comia nem bebia desde o seu arrebatamento até morrer, pois estava vendado ao mundo sensivel onde ainda se encontrava) no lugar onde foste ocultado.  

Há os que são reenviados, os que não são e nela são consumidos e perecem até à Resssureição final, e os a quem se dá a escolha.

Os reenviados se tiverem alcançado o mesmo nivel-a mesma estação iniciática dos que são retidos, são ‘superiores’ a eles.

Existem dois tipos de reenviados (ao mundo sensivel), o reenviado por si mesmo (o gnóstico que regressa para se aperfeiçoar por uma via iniciática diferente daquela que já percorreu), e o reenviado (pelo seu Senhor) às criaturas para as dirigir e guiar pelo exemplo e palavra ( ‘ãlim, é o conhecedor ou herdeiro, exemplo do verdadeiro servo de Deus pois só ele realiza a servidão absoluta, condição do mais alto grau da realização humana).   

A nós pertence-nos a subida, a Ele a recepção e a descida.'' 

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