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segunda-feira, 25 de março de 2013

O Sonho no xamanismo




O Sonho no xamanismo

Para os xamãs o sonho é uma porta do mundo Superior ou Celeste em alternativa ao transe ou ao estado visionário .

Todos os povos da Antiguidade, Egipto, Grécia, Meospotâmia, tinham templos-santuários dedicados ao sonho, chamdos templos Incubatórios de sonhos, como os Serápis e Esculápio, onde as pessoas vinham para receber em sonhos as curas para suas doenças.

Mas não era qualquer doente que podia entrar, tinha de ser ‘chamado’ em sonhos, por vezes as pessoas passavam dias, meses á porta do templo até terem a ‘autorização’ pelo sonho de que podiam entrar para receber a mensagem. 
Existem estelas onde está escrito : Sómente é ajudado, quem é chamado’.

Quem recebesse em sonho essa permissão, cumpria os rituais preparatórios locais (abluções na fonte sagrada, purificações, danças e canto, aplicação de ungentos psicotrópicos e ofertas sacrificiais de animais) e só então podia entrar no templo e lá dormir no chão da zona mais sagrada, onde estava a estátua do Deus. 

Em sonhos seria recebida a ‘receita’ para a cura pretendida que tornava as pessoas doentes em saudáveis.      

A versão iniciática e mistica destes templos era que a função deles era, não a a cura fisica, mas a cura espiritual, quem aqui vinha queria ser transformado por dentro, morrer para renascer, queria mudar de vida. 

A Incubação significa pois, ter sido chamado em sonhos, ter feito todas as práticas rituais prévias á entrada no templo para aí  dormir e receber em sonho a mensagem ( seja de cura fisica, ou de incio de uma transformação espiritual).   

Os templos de incubação estavam quase sempre em locais isolados, recônditos, selvagens, na natureza profunda e em geral, exigia um grande esforço fisico de caminhar, de peregrinar até lá, a verdadeira incubação começaria no esforço inicial para se libertar da letargia do mundo e se separar da sociedade humana. 

É a conhecida ‘jornada da alma’ para se conhecer.



Depois da dor fisica do caminho percorrido, o crente chegava ao templo já numa ‘nuvem’ de sacralidade e fazia os devidos rituais que o preparavam espiritualmente, que o induziam insconscientemente para uma mudança de estado de consciência ao fazer o contacto em sonhos com a Divindade.

Em Portugal, julga-se que isto ocorria no Santuário primitivo da Rocha da Mina, dedicado ao Deus da cura, Endovélico onde existe uma cavidade passível de ser uma eventual câmara incubatória.

Uma reminiscência moderna são as romarias portuguesas onde se come e dorme na floresta ou pinhal junto ao santuário.

O candidato a xamã só o é, depois de ter recebido ( ser ‘chamado’)  essa ordem dos Espiritos através dos sonhos. 

Os sonhos lúcidos são os únicos sonhos que contam para o xamã, onde o sonhador permanece totalmente consciente durante o acto de sonhar e pode agir dentro dele com uma liberdade ainda maior do que aquela a que está confinado na vida real. 

Livre e consciente no sonho o xamã viaja à velocidade da luz e com a liberdade dos ventos através dos mundos.

Costuma dividir-se os sonhos em 3 graus de importância :  os sonhos do crepúsculo, que são os sonhos kármicos e biográficos, restos da vida diária e profana ; os sonhos da meia noite, que são influenciados pelos espiritos e resultantes da interferencia de entidades não-humanas na esfera psiquica do sonhador e finalmente, os sonhos proféticos da alvorada, que ocorrem antes do acordar e que revelam o futuro imediato do sonhador.

Em geral considera-se que a maioria dos sonhos lúcidos ocorre no romper da alvorada.

Como preparativos para ter um bom sonho lúcido, o xamã usava várias técnicas, desde canções de poder, infusões de ervas sedativas, unguentos psicotrópicos, e simbolos materiais como as pedras do sonho.

Exemplo de uma canção de poder para repetir até adormecer aguardando por um sonho mensageiro :
No céu/ eu estou caminhando/ Um pássaro/ eu acompanho.     

As melhores pedras de sonho são as que os Espiritos proporcionam ao crente quando as apanha ao acaso, num passeio na natureza e nelas foca a sua intenção de ter um sonho lúcido revelador.


A Rectificação do sonho


Para um sonho ter valor concreto na vida do sonhador é fundamental que ele se materialize de alguma forma, que seja objectivado, sem isso, o sonho não completa por assim dizer, o seu ciclo natural.  

O sonho é um processo de 2 vias, uma para dentro pelo mergulho psiquico inconsciente no reino do sonho, outra para fora, trazendo do ‘outro’ lado mensagens que se transformam em conhecimentos e compreensão de processos espirituais mas também em objectos rituais, talismãs, obras de arte, máscaras rituais ou em cura pessoal ou da comunidade.

Quem era curado numa incubação de sonhos tinha de agradecer aos Deuses oferecendo uma dádiva, uma estela, que simbolizava essa objectivação, essa materialização onírica.

Sem rectificação, uma incubação onírica de nada vale, pois sendo o seu objectivo, o de mudar a vida da pessoa ou de uma comunidade, se isso não acontece na prática, o seu valor perde-se num ritual fantasioso e de mero devaneio.

Nas rectificações encontram-se as canções mágicas, os talismãs de poder, os artefactos rituais que o xamã recebe por instruções em sonhos e ao voltar as concretiza para seu uso doravante.

A rectificação ancora e liga a experiência incubatória do sonho no campo material da nossa realidade empirica e permite que o poder flutue entre dois mundos diferentes e que fundamentalmente exista equilibrio entre estas 2 faces complementares da vida humana. 

Abdullah ben Zayd, o companheiro do profeta Maomé, recebeu em sonhos o ‘chamado para a oração’, o adhan, que é ouvido ainda hoje cinco vezes ao dia no mundo muçulmano.




O sonho e a morte

O caminho da alma em sonhos é igual ao caminho depois da morte, na verdade, quem morria, dormia e quem dormia, morria. 
Alguns povos dizem que quem tinha morrido estava a ‘dormir’.

Os primeiros momentos do sonho são a imagem dos momentos que ocorrem na morte fisica.

Conseguir ter sonhos lúcidos,  viver e ‘trabalhar’ conscientemente os sonhos é antecipar a morte, compreendê-la, encará-la de frente e sobretudo não ter medo dela, é saber o que se passa nessa hora dramática para o ser humano, saber, em vida, se preparar para esse momento a partir da própria experiência e trabalho com os próprios sonhos.

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