-- De onde vens e para onde vais ?
-- Venho de Deus na escuridão e para Deus vou na Luz.

segunda-feira, 8 de março de 2010

O Caminho de Casa segundo o Mestre Sufi Farid Attar

A Parábola da Conferência dos Pássaros-Parte 3

O Rouxinol

O amoroso rouxinol foi o primeiro a adiantar-se, quase fora de si de paixão. Cada uma das mil notas do seu cantar extravasava emoção; e cada qual encerrava um mundo de segredos. Quando ele cantava esses mistérios, os pássaros silenciavam.

— Conheço os segredos do amor — disse. — Repito a noite inteira meus cantos amorosos. Não haverá um Davi infeliz para quem eu possa cantar os salmos ansiosos de amor? Por minha causa emite a flauta seus meigos queixumes e o alaúde, seus lamentos. Quando o amor me subjuga o coração, meu canto é como o suspiroso mar. Tão apaixonado estou pela Rosa que nem penso na minha própria existência, mas apenas na Rosa e no coral das suas pétalas. A jornada em demanda do Simurgh está acima das minhas forças; o amor da Rosa basta ao Rouxinol. É para mim que ela floresce com suas cem pétalas; que mais, portanto, posso desejar?

A Poupa replicou:

— Ó Rouxinol, tu, que serias capaz de ficar para trás, deslumbrado pela forma exterior das coisas, não te deleites mais com um apego tão ilusório. O amor da Rosa tem muitos espinhos; ela te perturbou e dominou. Embora seja bela, sua beleza logo se esvai. Quem procura a própria perfeição não deve deixar-se escravizar por um amor tão fugaz. Abandona a Rosa e cora por ti mesmo: pois ela se ri de ti a cada nova primavera e depois já não sorri.


O Pavão

Em seguida veio o Pavão dourado, com penas de cem — como direi? — de cem mil cores. Exibia-se, virando-se de um lado para outro, como se fosse uma noiva.

— O pintor do mundo — jactou-se — pegou na mão o pincel do djim para modelar-me. Mas se bem eu seja um Gabriel entre os pássaros, não me invejem a sina. Eu me dava bem com a serpente no paraíso terreno, e por isso fui ignominiosamente escorraçado de lá. Os que confiavam em mim privaram-me de uma posição de confiança, e meus pés foram minha prisão. Mas estou sempre à espera de um guia benevolente que me conduza para fora desta escura morada e me leve às mansões eternas. Não espero chegar ao Rei de que falais, bastar-me-á chegar ao seu portão. Como podeis esperar que me esforce por alcançar o Simurgh se já vivi no paraíso terreno? Não tenho outro desejo senão voltar a morar lá. Nada mais tem qualquer sentido para mim.

Redarguiu a Poupa:

— Estás-te desviando do verdadeiro Caminho. O palácio deste rei é muito superior ao teu paraíso. Não podes fazer nada melhor do que te esforçares por alcançá-lo. É a morada da alma, a eternidade, o objeto de nossos verdadeiros desejos, a casa do coração, a sede da verdade. O Altíssimo é um vasto oceano; o paraíso da bem-aventurança terrena não passa de uma gotinha; tudo o que não for esse oceano será loucura. Se podes ter o oceano, por que procuras uma gota do aljôfar vespertino? Quem partilha dos segredos do sol há de, acaso, perder tempo com um grãozinho de poeira? Quem tem o todo preocupa-se com a parte? Ocupa-se a alma dos membros do corpo? Se queres ser perfeito busca o todo, elege o todo, sê inteiro.

O Pardal

Veio então o Pardal, de corpo frágil e terno coração, tremendo da cabeça aos pés, como se fora uma chama. E disse:

— Estou atônito e desanimado. Não sei como existir e sou frágil como um fio de cabelo. Ninguém me ajuda, e sequer tenho a força de uma formiga. Não possuo penugem nem penas — nada. Como há de um covarde como eu viajar até onde está o Simurgh? Um pardal nunca o faria. Não faltam no mundo os que procuram essa união, mas ela não se coaduna com um ser como eu. Não desejo encetar uma jornada trabalhosa como essa por algo que jamais alcançarei. Se eu partisse em busca da corte do Simurgh, acabaria morrendo no caminho. Portanto, já que não estou, de modo algum, em condições de levar a cabo o empreendimento, contentar-me-ei com procurar aqui o meu José no poço. Se o encontrar e o tirar dali, alçarei voo com ele do peixe à lua.

A Poupa recalcitrou:

— Ó tu, que em teu desalento és por vezes triste, por vezes alegre, não me iludem tuas alegações artificiosas. Pequeno hipócrita! Até na humildade mostras uma centena de sinais de vaidade e orgulho. Nem mais uma palavra! Cala o bico e põe-te a caminho. Se morreres, morrerás com os outros. E não te compares a José!

1 comentário:

  1. Salam, Cristiano!
    Parabéns por ser um grande divulgador do Amor e Paz na Terra!
    Persevere, continue sua mensagem!
    Quando puder, visite-me tb em:
    http://denisebomfim.blogspot.com

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