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domingo, 14 de março de 2010

A Mão do Pai

Oh branda mão! Oh toque delicado!

«Esta «mão» é o Pai omnipotente e piedoso.

E devemos entender que visto que esta mão é tão generosa e doadora como é poderosa e rica, então, ricas e poderosas dádivas dará à alma, quando esta mão se abre para a alma para lhe fazer mercês, e assim ela lhe chama «branda mão».

Que é como se dissesse: Oh! mão tanto mais branda para a minha alma, que lhe tocas assentando-a brandamente, quanto mais que se a assentasses um pouco mais pesada, submergirias todo o mundo; «pois só com o teu olhar a terra estremece» (Sl. 53, 32), os povos desfalecem e «os montes se desmoronam» (Hb. 1, 6).

Oh, pois, outra vez, branda mão! pois, se foste dura e rigorosa para Job, tocando-lhe um tanto asperamente, para mim és mais amigável e suave do que para ele foste dura, e tanto mais, quanto mais amigável e graciosa e brandamente tocas de assento na minha alma!

Porque Tu fazes morrer e Tu fazes viver, e não há quem escape da tua mão! Mas Tu, ó divina vida! nunca matas, senão para dar vida, assim como nunca feres, senão para sarar.

Quando castigas, tocas levemente, e isso basta para consumir o mundo; porém quando regalas, muito de propósito assentas, e assim o regalo da tua doçura não tem medida.

Chagaste-me para me sarares, ó divina mão! e mataste em mim o que me tinha morta sem a vida de Deus em que agora me vejo viver.

E isto fizeste Tu na liberalidade da tua generosa graça de que usaste para comigo no toque com que me tocaste do «resplendor da tua glória e figura da tua substância» (Hb 1, 3), que é o teu Unigénito Filho, pelo qual, sendo Ele a tua Sabedoria, «atinges fortemente desde uma extremidade à outra» (Sb 8, 1); e este Unigénito Filho teu, ó mão misericordiosa do Pai! é o «toque delicado» com que me tocaste na força do teu cautério e me chagaste.

Oh! «toque delicado», Verbo Filho de Deus, que pela delicadeza do teu ser divino penetras subtilmente na substância da minha alma, e tocando-a toda delicadamente, em Ti a absorves toda em divinos modos de deleites e suavidade nunca «ouvida na terra de Canaan, nem vista em Teman!» (Br 3, 92).

Oh muito e de sobremaneira muito delicado toque do Verbo, que, tendo transtornado os montes e quebrado as pedras no monte Horeb com a sombra do teu poder e força que ia adiante de Ti, para mim és tão suave como Te deste a sentir ao profeta no silvo dum brando sopro!

Oh brando sopro! Como és subtil e delicado! Diz: como tocas tão subtil e delicadamente, sendo tão terrível e poderoso?

Diz isto ao mundo; mas não, não o queiras dizer ao mundo, porque ele não percebe nada desta brisa e ele não Te sentirá, pois «não Te pode receber, nem Te pode ver» (Jo 14, 17): antes, meus Deus e minha vida, só Te verão e só sentirão o teu toque subtil aqueles que, alheando-se do mundo, se subtilizarem, - conformando-se contigo - para que assim Te possam sentir e desfrutar.

A esses, tocas tanto mais subtilmente, quanto mais adelgaçada e polida e purificada tiverem a substância da sua alma, e mais alheada esta estiver de todas as criaturas, e de todo o seu ressaibo e contágio, morando Tu só nela, escondido, e muito de assento.

E assim «os escondes também a eles no esconderijo do teu rosto (que é o Verbo) do tumulto dos homens» (Sl 30, 21).»

São João da Cruz - Ch. II, 16-17.

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